A Reabilitãção

Publicado: 04/06/2011 em Só por Hoje

A reabilitação é o processo de tratamento da dependência que atua na desintoxicação do usuário. Este processo não é tão simples quanto aparenta, pois requer atenção, acompanhamento, dedicação e força de vontade. Existem discussões acerca da funcionalidade desse tratamento e alguns estudiosos afirmam que o resultado independe do motivo que levou à internação do dependente, enquanto outros afirmam que a eficácia do tratamento está condicionada ao interesse e dedicação do “paciente” dentro desse processo.

O tratamento mais comum, seja ele de internação ou de autoajuda, tem duração média de nove meses, considerando que este é o período de gestação e nascimento e a reabilitação é entendida como um renascimento do dependente. A fase mais difícil, conforme relatam alguns usuários1, está nos primeiros 40 dias. Este é período em que se encontram em processo de desintoxicação, as crises de abstinência são comuns e lidar com as elas torna-se complicado devido a contraindicação do uso de medicamentos que podem ocasionar dependência.

O psiquiatra especialista em drogas Ronaldo Laranjeira, explica que a dependência química cria uma ilusão de prazer que acaba perturbando outros mecanismos cerebrais e que, durante a reabilitação, é necessário proporcionar ao dependente químico, outras formas de sentir prazer.

[…] Se fumando um baseado a pessoa relaxa, findo o efeito, a ansiedade ganha força, pois a síndrome de abstinência é imediata. É o chamado efeito rebote. A cocaína age de forma diferente. O efeito rebote está na impossibilidade de sentir prazer sem a droga. Passada a excitação que ela provoca a pessoa não volta ao normal. Fica deprimida, desanimada. Tudo perde a graça. Como só sente prazer sob a ação da droga, torna-se um usuário crônico. Às vezes, tenta suspender o uso e reassumir as atividades normais, mas nada lhe dá prazer. Parece que, por vingança divina, o cérebro perdeu a capacidade de experimentar outras fontes que não a desse prazer artificial que a droga proporciona. Essa é uma das tragédias a que se expõem os dependentes químicos. No processo de reabilitação, quando a pessoa para de usar droga, é fundamental ajudá-la a reencontrar fontes de prazer independentes da substância química. (LARANJEIRA In: VARELA, online).

 “A depressão é o transtorno que mais se associa ao abuso e à dependência de drogas. Mas, outros transtornos são frequentemente encontrados entre os dependentes tais como: o transtorno de ansiedade, o transtorno obsessivo compulsivo, transtornos de personalidade e, mais raramente, alguns tipos de psicoses” (CEBRID, 2011, online).De acordo com o psicólogo Evander Gomes, ainda são comuns, durante a crise de abstinência, “ansiedade, irritabilidade, insônia ou tremor quando a dosagem é reduzida ou o consumo é suspenso”, (GOMES, 2011, online).

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1Realizamos entrevistas com dependentes nos dias 15 e 28 de novembro de 2010

 Por tais razões, é fundamental que o processo seja acompanhado por médicos especializados, sejam eles psicólogos, psiquiatras ou terapeutas para que outras patologias – que os dependentes tenham desenvolvido em decorrência do uso das substâncias recebam a devida atenção, o que aumenta a probabilidade do tratamento ser bem sucedido.

Durante a nossa pesquisa, realizamos entrevistas com o diretor da Instituição Manassés2, Emerson Luiz e o coordenador do projeto “Dose Mais Forte”, Sulivan Barreto e ambos concordam que a motivação do dependente reflete de forma significativa no sucesso do tratamento e que se fazem necessárias ações complementares ao tratamento, bem como, o acompanhamento e monitoramento dos pacientes/dependentes.

Característica comum, presente em todos os casos de dependência química, o preconceito, é a primeira barreira que precisa ser transposta. Na maioria dos casos, o preconceito tem início dentro da própria família, que se recusa a expor o problema.

Em contrapartida, a família tem um papel de grande importância durante a reabilitação e cabe a ela a função de acompanhar o dependente e a evolução do tratamento. É importante ressaltar que: “A internação de um dependente de drogas sem necessidade pode levar, até mesmo, a um aumento do consumo” (CEBRID, 2011, online).

“Sendo o tratamento de natureza individual, e privilegiando-se, evidentemente, o atendimento ao usuário, aqueles que portavam o título de familiar viam-se submetidos às disponibilidades extremamente limitadas de oferta de tratamento” (MOTTA, 1996, p.1). Foi com base nessa justificativa e por considerar os transtornos aos quais as famílias dos usuários de drogas são submetidas, que o Centro de Estudos e Terapia do Abuso de Drogas – CETAD

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2Comunidade Terapêutica localizada na Região metropolitana de Salvador.

vinculado à Universidade Federal da Bahia, criou, em março de 1996, o Grupo de Espera da Família. O grupo tem por função oferecer suporte à família e fazê-la entender qual papel deve desempenhar durante a reabilitação.

Do ponto de vista clínico, os efeitos do trabalho dos familiares no Grupo refletem-se diretamente na cura dos usuários, na medida em que a atenção imediata possibilita uma certa liberação do mal-estar, e a escuta intervém num momento considerado crítico pelos protagonistas da estória. Do outro lado, o trabalho de análise dos pacientes usuários vê-se fortalecido, posto que seus familiares passam a implicar-se no tratamento, enquanto sujeitos, e não apenas enquanto instâncias de referência. (MOTTA, 1996, p. 3).

O National Institute for Drug Abuse(NIDA), órgão do governo americano, que tem por função regular as políticas sobre drogas, estabeleceu 13 princípios que podem, de alguma maneira, servir de base para avaliação dos serviços de tratamento. Intitulado “Princípios para o tratamento da adicção: um guia baseado em evidências”,apresenta em um dos “mandamentos” outro fator importante e relevante neste processo:

A duração apropriada para um indivíduo depende de seus problemas e necessidades. Pesquisas indicam que para a maioria dos pacientes, o limiar de melhoria significativa é alcançada com 3 meses de tratamento. Após alcançar esse limiar, um tratamento adicional pode produzir mais progresso rumo à recuperação. Devido ao fato de as pessoas com freqüência deixarem o tratamento prematuramente, os programas devem incluir estratégias para envolver e manter os pacientes. (UNIAD, 2011, online).

 Em outras palavras, o acompanhamento seja ele da família, amigos, médicos e/ou psicólogos irá refletir no sucesso do tratamento evitando assim, riscos de uma possível recaída. Este acompanhamento em Salvador pode ser feito individualmente nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), nas Comunidades Terapêuticas ou ainda, em grupo através dos Narcóticos Anônimos (NA).

*Extraído do Memorial Descritivo do Livro-reportagem Só por Hoje – A luta dos dependentes químicos em reabilitação. Autor: Lucas Figueredo

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